quinta-feira, 31 de março de 2011

Foi inevitável

Foi inevitável. Pela manhã de 30 de março de 2011, ao ouvir as notícias que anunciavam o falecimento do ex-vice presidente José Alencar, lembrei-me do meu pai Luiz Tecli Coppe. É que os dramas da personagem mais conhecida do Brasil me fizeram reviver os momentos dramáticos e traumáticos vivenciados pelo meu pai - um menos conhecido - que também lutou bravamente contra o câncer no intestino. Ele faleceu em dezembro de 2004.
Falar da morte de uma pessoa querida e amiga não é tarefa fácil, entretanto, minhas memórias surgiram como as larvas de um vulcão do Pacífico e não pude contê-las. A comoção tomou conta do meu viver. As analogias foram inevitáveis.
Não posso falar de Alencar pois nunca fui próximo a ele. Falo, então, de quem conheci bem.
Meu pai foi um cara legal. Um sujeito de muitas paixões, marinheiro e amante da vida e da simplicidade. Ele trabalhava como Técnico em Instrumentação pneumática e eletrônica, na extinta Siderúrgica Mendes Júnior, instalada na cidade de Juiz de Fora - MG. Nessa empresa, no desenvolver competente de sua função, ele conhecia todos os manômetros pelo nome e dava manutenção a cada um deles com precisão cirúrgica. Na intimidade da casa, era duro e firme com as palavras, mas profundamente sensível às belezas do cotidiano e determinado no cuidado com a esposa e filhos, continuamente exaltando a bandeira da honestidade, santa honestidade. Ele sempre se assumiu como um apaixonado por futebol, carro, religião, sinuca, samba canção e praia. Era muito fácil vê-lo emocionado frente a um momento de revelação da sensibilidade, fossem elas artísticas ou naturais. Enfim, um capixaba com espírito carioca, profundamente brasileiro.
O maior legado que esse homem me deixou foi o da humildade. Nunca foi de esnobar ou mostrar ser o que não era. Sempre nutrirei profunda admiração por esse legado.
Entre 2000 e 2004, ele lutou bravamente contra o câncer. Nunca perdeu a esperança e, como Jó, enfrentou sua luta pessoal com resignação. Nunca o vi difamando os céus, sequer as pessoas. Nem mesmo a fraqueza do corpo provocada pelas múltiplas quimio e radioterapias foi capaz de fazê-lo tombar em ressentimentos.
Tive o privilégio de conviver com ele nos últimos 10 meses de sua vida depois de uma decisão arrojada de mudar-me, com a família, da cidade de Belo Horizonte para Juiz de Fora. Nesse tempo de aproximação, se estabeleceu em minha mente um misto entre alegria e indignação. Não era fácil perceber meu pai naquela situação.
Então, diante do ocorrido recente, estampado na mídia, foi realmente inevitável não estabelecer comparações, guardadas as devidas proporções.
A vida continua e ela continuará a pregar peças em outros Coppes, Alencares, Marias e Sebastianas. A vida continua e sempre apontará as nossas fraquezas, as nossas limitações, as nossas lutas.
E diante desse quadro, não me sobra alternativas a não ser silenciar-me saudosamente em meio a preces.

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